segunda-feira, 16 de novembro de 2009

LIBERDADE OU AUTONOMIA? ... [6]


2.3.3 Cosmovisões


Torna-se tarefa difícil definir uma cosmovisão em obras cinematográficas, pois muitas vezes elas trazem elementos de várias perspectivas. A síntese, no entanto, não oculta as noções dos produtores. A ênfase sobre a liberdade, por exemplo, traz consigo influências do existencialismo, do niilismo, e do pós-modernismo.

Godawa (2004, p.66) indica a relação entre estas noções, demonstrando que há influência de Niestzsche – o "pai” do niilismo – sobre o existencialismo. Ele também ressalta o desejo de liberdade como marca da corrente existencialista.

Embora alguns dos pensadores modernos mais conhecidos que abraçaram o existencialismo sejam Jean-Paul Sartre (1905-1980), Albert Camus (1913-1960) e Karl Jaspers (1883-1969), suas raízes podem, em grande parte, ser rastreadas até dois nomes: Soren Kierkegaard (1813-1855), um cristão, e Friedrich Nietzsche (1844-1900), um ateu. […] por enquanto gostaria de focalizar as três ênfases da visão de mundo existencialista em filmes contemporâneos: (1) o acaso se sobrepõe ao destino, (2) a liberdade se sobrepõe às regras e (3) a experiência se sobrepõe à razão.

Para Sire (2004, p.121) o Existencialismo é uma resposta ao Niilismo. Ainda assim, traça as origens de ambos – pelo menos do existencialismo ateísta – no naturalismo. A mesma ênfase sobre a liberdade é definida como Sire (2004, p.126) como uma das proposições básicas do existencialismo.

[…] segue-se que cada pessoa é totalmente livre. Cada um de nós não é obrigado, mas radicalmente capaz para fazer qualquer coisa imaginável com nossa subjetividade. Podemos pensar, ter vontade, imaginar, sonhar, projetar visões, considerar, ponderar, inventar. Cada um de nós é rei do seu próprio mundo subjetivo.

A justificativa de Godawa para a relação entre o existencialismo e o pós-modernismo está na afirmação de Sire (apud GODAWA, 2004, p.90) a respeito do primeiro como base filosófica para o último.

Grenz (2008, p.121) demarca a publicação de Assim falava Zaratustra, de Nietzsche, como o “início da gestação do período pós-moderno". Na medida em que o pós-modernismo advoga o fim das metanarrativas, buscando a liberdade em relação aos sistemas em alguma medida aprisionadores, como os sistemas religiosos, ele encarna o espírito do Show de Truman. Segundo Grenz (2004, p.72), “a perspectiva pós-moderna implica o fim do apelo a qualquer mito legitimador dominante, seja ele qual for”.

A visão de um homem covarde, escravizado pelo sistema e pelas pressões sociais, que, finalmente, decide romper com o seu padrão para buscar a autonomia também reflete a postura legitimadora e autenticadora do existencialismo, como descrito por Schaeffer (2001, p.46-7).

A possibilidade dos trocadilhos revela o espírito da obra. O “verdadeiro homem” (em inglês: true man – pronúncia idêntica à do nome Truman) é aquele que desafia os sistemas opressores à sua volta, que podem ser a sociedade, a religião, ou o próprio Deus (Christof, ou Christ off – "Cristo fora", como indicado em citação acima), e os transgride em um gesto de afirmação da sua autonomia.

A cena final, na qual Truman conversa, olhando para os céus com a voz de Christof, projetada a partir do Sol, indica a semelhança do homem falando com o seu Criador. O resultado proposto na obra é a libertação do homem em face da prisão religiosa ou divina. Estar no mundo de maneira autônoma, mesmo que inseguro, é melhor do que viver aprisionado.

Nenhum comentário: