terça-feira, 12 de junho de 2007

Ser contra a ordenação feminina é ser machista??

Aparentemente o meu último texto gerou algum tipo de reflexão. Isso é bom. Contudo, aquela pequena constatação não teve, nem de longe, a pretensão de ser exaustiva ou completa, como nenhum de meus textos pretende ser. Não possuo a capacidade de exaurir um assunto, apenas pontuo questões e destaco elementos para aprofundar a reflexão sobre determinadas temáticas. O fato é que algumas pessoas responderam aos pensamentos ali registrados de modo bastante previsível, e contra uma dessas reações – talvez a mais comum – eu escrevo agora.

Um filósofo nascido no século XVIII, chamado Schopenhauer, escreveu um livro apontando algumas falácias na argumentação, e demonstrando como nos preocupamos tanto em vencer um debate, que muitas vezes utilizamos estratégias desonestas para isto. Em sua descrição dos estratagemas estava aquele que foi chamado de “rótulo odioso”. Trata-se de rotular de antemão o argumento ou o pensamento de alguém, para conferir-lhe descrédito e vencer a questão não pela verdade, mas por suscitar sentimentos ruins contra o oponente.

Um modo rápido de eliminar, ou, ao menos, de tornar suspeita uma afirmação do adversário é reduzi-la a uma categoria geralmente detestada, ainda que a relação seja pouco rigorosa e tão só de vaga semelhança. Por exemplo: “Isso é maniqueísmo”, “É arianismo”, “É pelagianismo”, “É idealismo”, “É panteísmo”, “É brownianismo”, “É naturalismo”, “É ateísmo”, “É racionalismo”, “É espiritualismo”, “É misticismo”, etc. Com isto, fazemos duas suposições: 1) que aquela afirmação é efetivamente idêntica a essa categoria, ou, ao menos, está comprometida nela e estamos dizendo: “Ah, isto nós já sabemos!”; e 2) que esta categoria já está de todo refutada e não pode conter nenhuma palavra verdadeira. (SCHOPENHAUER, 1997, p. 174)

Acredito que fui vítima desse estratagema. Algumas pessoas, em vez de considerarem seriamente a questão, simplesmente esconderam-se atrás da frase: “Isso é machismo!”. Pois bem, seria interessante observarmos por que isso não é machismo, na esperança de que alguns considerem o assunto como ele deve ser observado.

Consultei ao dicionário Aurélio (1999, p. 1248), e busquei o significado de alguns termos:

Machismo: Atitude ou comportamento de quem não aceita a igualdade de direitos para o homem e a mulher, sendo contrário, pois, ao feminismo.
Machista: relativo ao, ou que é adepto do machismo.

Em nenhum momento a questão girou em torno de direitos do homem ou da mulher. Observem que o ministério pastoral não é uma questão de direitos, mas de vocação. Os direitos de homens e mulheres são os mesmos, mas os papéis são exercidos de modos distintos. Muitos são os teólogos que reconhecem este ponto. Cito dois:

A diferença de funções não implica em diferença de valor ou em inferioridade de um em relação ao outro. (...) O homem foi feito como cabeça da mulher – esse princípio implica em diferente papel funcional do homem, que é o de liderar. Não implica que o homem é superior à mulher, em qualquer sentido. (LOPES, 1997, p. 6)

Há um paradoxo no relato da criação. Enquanto Gênesis 1 ensina que Deus criou homem e mulher à Sua imagem igualmente, Gênesis 2 acrescenta que Ele fez o homem como o cabeça e a mulher como ajudadora. Este desenrolar é muito significativo. (ORTLUND JR., 1996, p. 36)

Desta forma, o ponto não é sobre a igualdade existente entre homem e mulher. A Bíblia reconhece e ensina isto. Portanto, o machismo deve ser visto como deturpação do ensinamento Bíblico, e deve ser rejeitado com a mesma ênfase que o feminismo.

Demonstrado que o machismo não é correto, e que a ordenação feminina não está relacionada ao machismo, devemos ainda observar, ainda que rápida e superficialmente, o fundamento da oposição ao exercício do ministério pastoral por parte de mulheres.

Para o propósito deste artigo, que não pretende ser por demais extenso, quero me deter em apenas um texto bíblico – 1 Tm. 2.12-14: “E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio. Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”.

Rápidas considerações:

1.O apóstolo não permite que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem. A proibição para o ensino não é absoluta, visto que em 1 Coríntios Paulo reconhece e permite que mulheres profetizem utilizando o véu (símbolo da submissão), ou recomenda em Tito que as mulheres mais velhas instruam (Tt.2.4). O fim da frase nos ajuda a compreender o início. O ensino que Paulo tem em mente é aquele no qual a mulher exerce a autoridade dada por Deus ao homem.

O ensinar que Paulo proíbe é aquele em que a mulher assume uma posição de autoridade eclesiástica sobre o homem. Isso é evidente do fato que Paulo fundamenta seu ensino nas diferenças com que homem e mulher foram criados (v.13), e pela frase “autoridade sobre o homem” (v.12b). Um equivalente moderno seria a ordenação como ministro da Palavra, para pregar a Palavra de Deus numa igreja local. (LOPES, 1997, p.50)

2.A base do argumento de Paulo está em dois pontos:
2.1 Adão foi formado antes de Eva. Segundo o apóstolo, há uma razão para Adão ter sido criado antes de Eva, e a implicação disto é que o homem tem autoridade sobre a mulher. Na visão de Paulo, a autoridade do homem sobre a mulher não permite que ela exerça determinadas funções, que foram destinadas para homens.

2.2 Eva pecou antes de Adão. Paulo não está culpando Eva do pecado do mundo, mas está constatando que ela pecou antes de Adão, e ele faz relação entre este fato e a impossibilidade do exercício da autoridade de homem pela mulher. Segundo o apóstolo, o pecado da mulher é uma das razões para que ela não exerça autoridade de homem.

É interessante observar que Paulo também não utilizou argumentos machistas. O seu discurso de modo algum apela para uma diferença de direitos entre homens e mulheres, mas apenas para a distinção de funções, por razões plausíveis.

Aliás, por falar em “razões plausíveis”, é importante destacarmos que Paulo nem pensou em sua cultura para argumentar. Muitos são os que afirmam ser esta uma questão cultural, e que hoje, como estamos em época diferente, e numa cultura diferente, seria permitida a ordenação feminina. Não é isto o que vemos no discurso do apóstolo. Nada cultural, o seu fundamento está na ordem da criação e da queda.



REFERÊNCIAS:

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa.3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
LOPES, Augustus Nicodemus. Ordenação de mulheres: Que diz o Novo Testamento?. São Paulo: PES, 1997.
ORTLUND JR., Raymond C. Igualdade masculino-feminina e liderança masculina. In: PIPER, John e GRUDEM, Wayne. Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja e na sociedade. São José dos Campos: Fiel, 1996.
SCHOPENHAUER, Arthur. Como vencer um debate sem precisar ter razão: em 38 estratagemas: (dialética erística). Rio de Janeiro: Topbooks, 1997.

3 comentários:

Unknown disse...

Allen,

ótimo post, parabéns pela sobriedade em tuas colocações!

interessante o posicionamento de Schopenhauer, apesar de já ter lido algo parecido em Nicolau Maquiavel, o argumento dele é bastante válido (e atual).

PS. até hoje estou esperando tu me ligar para comermos aquela pizza! (algo que você prometeu durante o EPL)!!! rsrs

Unknown disse...

Cara,

Eu me lembrei lá em Fortaleza, mas foi tudo tão corrido que eu não pude te ligar...
perdão, brother!
Mas a nossa pizza ainda vai rolar!
abraço
:) SDG

Unknown disse...

"Mas a nossa pizza ainda vai rolar!"

Eu Creio!! rsrs