segunda-feira, 26 de março de 2012

NOVO BJC

O BJC agora tem novo endereço e formato. Este espaço vai ficar como registro histórico, mas as atualizações agora serão realizadas no endereço: http://allenporto.wordpress.com.

Visite lá, e divulgue pra quem você puder. Assine o feed do novo BJC e acompanhe!

terça-feira, 13 de março de 2012

O descanso do pastor

originalmente publicado em http://iprenascenca.com


Para escândalo dos reformados radicais (também chamados de neopuritanos), os pastores são os primeiros a quebrar o mandamento do "Dia do Senhor". Mesmo os pastores "neopuritanos". Nesse dia eles aconselham, trabalham elementos finais (espero!) de seus sermões, às vezes têm reunião com o conselho da igreja, etc. Exercem as atividades que definem o seu trabalho.  


Mas tenho pouco ou nenhum interesse pela opinião radical sobre a atividade do pastor aos domingos. Acredito que já existe um discurso definido por este grupo, para justificar o trabalho pastoral no "Dia do Senhor". Mencionei "os mais reformados dentre os reformados" apenas por serem eles os que fazem maior barulho sobre este mandamento. 


Também não pretendo me aprofundar na discussão do significado mais pleno do ponto. Essa é uma conversa que vai longe, e o meu objetivo é tocar um dos sentidos envolvidos no mandamento: o do descanso. Por isso passo de uma lógica mais técnica e elaborada, para uma mais simples: se os pastores trabalham duro (normalmente) aos domingos, enquanto este é o dia de descanso da maioria, quando os pastores descansam?


Há quem pense que os pastores trabalham aos domingos, ou mesmo que não trabalhem nunca, e por isso sempre devem estar livres e disponíveis para qualquer chamado ou reivindicação da igreja. Já ouvi pastores falando bobagens do tipo: "eu sou pastor, mas eu trabalho" - numa brincadeira sem sentido e autodestruidora. John Piper nos ajuda a entender um pouco da jornada e do desgaste pastoral: 
A maioria dos nossos irmãos não faz idéia do preço que se paga por duas ou três mensagens semanais em termos de exaustão espiritual e intelectual. Sem contar o esgotamento causado pelos sofrimentos familiares, as decisões da igreja, os dilemas morais e teológicos imponderáveis. Eu, por exemplo, não sou um poço artesiano, Meu cântaro se esvazia mesmo quando dele nada se verte. Meus ânimos não se revigoram na correria. A carência de tempo para a leitura tranquila e reflexão, além da urgência do preparo do sermão, reprime minha alma e, logo, o espectro da morte espiritual se manifesta. Poucas coisas me assustam mais que o início da esterilidade proveniente das responsabilidades desmedidas que mal permitem a nutrição espiritual e a meditação. (Piper, Irmãos, nós não somos profissionais, p. 81-2).
O resultado de um pastor esgotado é trágico.
Este não é um pensamento novo. Grandes nomes da história da igreja que pensaram sobre o ministério pastoral trataram a questão. O pastor batista reformado Charles Spurgeon, considerava esse tempo essencial para resgatar algum tipo de vigor ao ministro, bem como para preservá-lo de sucumbir aos males do esgotamento.
Se um homem for de natureza alegre como um pássaro, dificilmente poderá manter-se assim ano após ano contra esse processo suicida. Fará do seu escritório uma prisão e de seus livros carcereiros de um presídio, enquanto do lado de fora da sua janela a natureza acena-lhe com a vida saudável e chama-o para a alegria. Aquele que esquece o zumbir das abelhas na urze, o arrulho dos pombos selvagens na floresta, o canto dos pássaros no arvoredo, o ondular do regato por entre o junco, e os lamentos do vento entre os pinheiros, não tem por que se espantar caso o seu coração olvide cantar e sua alma fique pesarosa. Passar um dia respirando o ar fresco das montanhas, ou fazer uma excursão de algumas horas na umbrosa tranquilidade das copadas faias, servirá para varrer as teias de aranha das cabeças cheias de vincos dos nossos fatigados ministros que já andam meio mortos. Uma tragada de ar marinho, ou uma firme caminhada contra o vento, não dará graça à alma, que é o que há de melhor, mas dará oxigênio ao corpo, coisa que vem em segundo lugar. (Spurgeon, Lições aos meus alunos 2, p. 239-240).
Mais recentemente o Pr. Conrad Mbewe (já chamado de "O Spurgeon africano") escreveu sobre o mesmo assunto, enfatizando o elemento do cuidado pessoal do pastor. Para Mbewe, é necessário compreendermos a amplitude desse cuidado pessoal. Isso envolve a vida "espiritual, física, emocional, intelectual e doméstica". Para demonstrar o ponto, cita um exemplo mencionado pelo pregador Martyn Lloyd-Jones.
Certa vez, um pregador muito conhecido no Reino Unido foi pedir conselhos ao Dr. Martyn Lloyd-Jones. Ele sentiu-se tão seco espiritualmente que estava pensando seriamente em abandonar o ministério pastoral. Sua vida de oração estava no nível mais baixo possível. Ele sequer sentia amor pelas almas e se via como um completo hipócrita por ainda estar no ministério. Quando o Dr. martyn Lloyd-jones ouviu tudo o que este pregador tinha a dizer, aconselhou-o a tirar umas férias. O pregador, lembrando-se deste evento, disse que ficou extremamente desapontado pelo fato do Dr. Lloyd-Jones não lhe dar outro conselho, além de tirar férias.  No entanto, em respeito ao "doutor", ele acatou a sugestão. Seu testemunho foi que após aquele tempo de férias, não precisou voltar a falar com seu conselheiro. O gozo espiritual havia voltado. Ele estava espiritualmente alegre outra vez. A lição que aprendera foi muito simples - todas as áreas da sua vida estão interligadas. Este homem havia negligenciado o descanso físico e emocional, e isto teve um efeito visível em sua vida espiritual. (Mbewe, Tem cuidado de ti mesmo, em: Amado Timóteo,  p. 35).
O pastor Richard Mayhue destaca outro elemento que brota do ponto em foco: a relação do pastor com sua família. Destacando uma pesquisa realizada em 1992, Mayhue (A família do Pastor, em: Ministério Pastoral, p.163) demonstra que a dificuldade conjugal mais encontrada nas famílias pastorais foi a falta de tempo suficiente em conjunto. Quando o pastor reserva tempo para seu descanso, e a igreja respeita este momento, não apenas ele será livrado de problemas físicos e espirituais, como também poderá investir mais e melhor em sua família - a base de seu ministério (tudo começa no lar).


O pastor segue trabalhando aos domingos, provavelmente mais do que a maioria de suas ovelhas. Deste modo, a pergunta volta: quando os pastores descansam?

Existem igrejas sem nenhuma previsão de um dia de descanso para o seu pastor. Ele trabalha de domingo a domingo, ininterruptamente. Quando aparece esgotado, simplesmente é criticado, ou mesmo substituído por alguém que "demonstre mais gás e compromisso com a obra". Espero que as igrejas a pensar deste modo sejam poucas. Acredito que a prática mais comum adotada pelas igrejas, é a de separar algum outro dia na semana para o descanso pastoral. Em minha breve experiência, tenho percebido que a Segunda-feira é normalmente este dia. Na segunda, muitos pastores podem acordar mais tarde, passear com sua esposa e filhos (quando a agenda destes permite), assistir um filme, dedicar-se a leituras mais leves, etc. Esta não é uma regra, no entanto. Conforme a agenda da igreja, outro dia pode ser escolhido. O importante é que a igreja reconheça a necessidade de ter um período destacado para o descanso do seu pastor, sob pena de resultados trágicos para a vida dele e da comunidade.

Além deste dia específico, é importante que a igreja considere o período de férias como natural e precioso para o ministro. Conheci pessoas que afirmavam explicitamente que o pastor não deveria ter direito a férias, porque "não se tira férias de igreja", ou alguma variante desse argumento. Entendo ser isso uma noção errônea e perigosa. Quando compreendemos mais adequadamente uma teologia bíblica do corpo, que tenha fundamento no descanso do sétimo dia (que mudou para o primeiro), ou algo envolvido com o jubieu, a mordomia de nosso corpo e o valor da matéria, além de pensarmos nas questões familiares, não teremos dificuldades com férias pastorais.


Pastores precisam descansar...
Dito isto, é preciso pensar em outras situações.  O descanso do pastor de modo algum pode desconsiderar as urgências de sua vocação. Necessidades extremas devem tirar o ministro de sua folga, e levá-lo ao exercício do pastoreio. Membros que falecem, casais à beira da separação e pessoas em crises graves podem exemplificar bem situações nas quais o descanso é deixado de lado, e pastor volta ao trabalho. Tendo o princípio bem estabelecido, as situações de interrupção da folga serão justas e adequadas, e terão esse caráter de exceção mantidas.

O outro ponto é quando o pastor é workaholic - um tipo de viciado em trabalho. Não é difícil vermos, como o Pr. Conrad Mbewe mencionou, ministros que negligenciam o seu descanso, sempre se envolvendo com algo para resolver. Tais líderes precisam reconhecer o perigo deste estilo de vida, e a igreja pode orar para que seu pastor conheça seus limites e os respeite. Penso sobre isso enquanto eu mesmo, no meu dia de folga (segunda-feira), estou aqui escrevendo um artigo para instruir as ovelhas e falhando em simplesmente descansar. Ainda estou aprendendo. Que Deus nos ajude, e renove as forças de nossos pastores. 

sexta-feira, 9 de março de 2012

"Pagos" pra sabotar

É notável ver indivíduos que juraram defender o Credo dos Apóstolos, atacá-lo em cada um dos seus artigos. Consideramos alguém como um representante exato do Islã se ele ou ela rejeita os artigos principais dessa religião? Buscamos uma descrição fiel do ensino budista de alguém cujo modo de vida tem sido caracterizado pela devoção a "ridicularizar" as alegações budistas? Hoje, contudo, temos pastores, missionários, professores de seminário, burocratas denominacionais, e outros, cujos salários são pagos por muitos discípulos genuínos de Cristo, atacando descaradamente os próprios ensinos que prometeram defender.

Michael Horton, Creio, p. 89

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Livros BJC: Relacionamentos - uma confusão que vale a pena


Após muito tempo volto a comentar algumas obras lidas recentemente, e outras que desejo criticar ou comentar.
Junto com esta iniciativa, estou trabalhando em um projeto paralelo - o Livros BJC: uma espécie de livraria online, onde você pode encontrar algumas das obras recomendadas (visite quando puder - o site ainda está sendo alimentado, mas já é possível ver alguma coisa).
Ironicamente, a obra que agora resenho não está à venda no site (sou um péssimo negociante, eu sei...).

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TRIPP, Paul; LANE, Tim. Relacionamentos: Uma confusão que vale a pena. São Paulo: Cultura Cristã, 2011. 176 p.

Provavelmente eu sou suspeito para escrever sobre este livro, porque desde que li "Instrumentos nas mãos do Redentor" passei a apreciar amplamente Paul Tripp.
Tripp e Tim Lane se encontram neste livro para escrever sobre um tema importante, massificado e mal entendido. Muitas igrejas do nosso tempo falam que o importante não são as doutrinas, mas os relacionamentos, como se a realidade bíblica possibilitasse a exclusão de um ou outro. (Aliás, se você prioriza os relacionamentos sobre a doutrina, você está seguindo uma doutrina! - irônico, né?).
A maioria do discurso evangélico e do psicologizado sobre relacionamentos é baseado em premissas falsas. Tripp e Lane nos ajudam a ajustar o foco, compreender a dimensão mais ampla e profunda da centralidade de Deus, e assim agir em direção ao próximo.
O livro, editado pela Cultura Cristã, tem uma capa significativa, mas um tanto deficiente em beleza e harmonia. Não sou profissional da área, mas percebo o avanço no projeto gráfico de várias outras editoras, e ainda algum atraso nos títulos da Cultura Cristã. Considerando que algumas pessoas compram o livro pela capa, isto deveria ser melhor pensado e trabalhado. Dito isto, acredito que houve melhora na diagramação. Talvez porque o original tenha tais quadros, talvez não. O fato é que houve um pouco mais de ousadia na tipografia, quadros e símbolos, e isso melhora a leitura e o visual do texto. Infelizmente as notas estão no fim do capítulo e não no rodapé, mas como cada capítulo possui poucas notas, o problema é minorado.
Gosto dessa obra porque é de fácil leitura, recheada de exemplos e ilustrações, e assim possui grande alcance. Qualquer cristão pode ler, sem precisar ser um "líder", "conselheiro", "psicólogo cristão", ou técnico neste sentido. O livro é escrito para que todos os cristãos percebam a riqueza dos relacionamentos e a ação graciosa de Deus neles, de modo que toda a igreja está envolvida neste projeto.
O livro também me agrada por ser realista. Não encontramos aqui palavras de encorajamento baseadas em um salto irracional, em uma esperança infundada. Tripp e Lane destacam os efeitos da queda, e assim compreendem adequadamente as dificuldades e lutas nos relacionamentos do dia a dia. Eles afirmam: "Se você quiser desfrutar de algum progresso ou de alguma bênção em seus relacionamentos, precisará reconhecer seu pecado com humildade e dedicar-se ao esforço que eles exigem" (p.19). Não há a falsa ilusão ou a perspectiva romântica e idealista de que os problemas sumirão num passe de mágica, ou antes, que eles não existem, e tudo é "paz e amor". Pelo contrário, reconhecem os efeitos do pecado, e assim lidam com os conflitos e dificuldades que existem nos relacionamentos com honestidade e realismo.
"A saúde e maturidade de um relacionamento não se refletem na ausência de problemas, mas si na forma como lidamos com os conflitos inevitáveis" (p. 20)
Deste modo, não se trata de mais um livro de auto-ajuda ou o que o valha, e sim de uma obra cuja abordagem e compreensão dos relacionamentos vem submetida à matriz Criação-Queda-Redenção, característica da visão cristã de mundo.
Não apenas é realista, mas traz esperança. Esta obra não se deixa desanimar pela fragilidade e feiúra que atinge os relacionamentos após a queda - e em decorrência dela. Os autores estão olhando para Jesus e Sua obra restauradora, e assim encontram esperança e graça para lidar com os mais difíceis problemas, e ainda assim afirmar que a restauração é possível e real. A obra contradiz o cinismo e ceticismo contemporâneo, que leva muitos a romper relacionamentos sem acreditar em transformação. Ela é possível pela obra completa de Jesus na cruz.
Os autores acertaram em cheio ao abordar a dimensão mais profunda, do coração. Tripp e Lane não se preocupam tanto em dar dicas de como você pode restaurar um problema relacional, mas nos levam à compreensão mais adequada das nossas expectativas e motivações, de nossa identidade e senso de realização. Ajudando-nos a perceber o deslocamento de nosso coração para o lugar errado, permitem que compreendamos o ponto essencial, e sejamos reconduzidos a Jesus, para que, tendo a raiz da questão tratada, possamos ter práticas transformadas.
Gosto também da variedade de questões trabalhadas. Uma breve olhada no sumário nos permitirá perceber o ponto: Pecado, objetivos pessoais, adoração, palavras, obstáculos, perdão, esperança, fardos, misericórdia, tempo e dinheiro, Providência e saindo para o mundo são alguns dos capítulos da obra. A diversidade de assuntos nos permite uma visão abrangente das questões envolvidas nos relacionamentos, e a percepção da graça de Deus nos mais variados assuntos.
O ponto mais importante, no entanto, é que o livro tem o evangelho como centro. Tripp e Lane trabalham todas as questões com foco na obra completa de Jesus na cruz, e na adoração a Deus. Por isso revelam os ídolos que estão envolvidos nos problemas relacionais e nos levam a encarar o pecado, ao mesmo tempo em que apresentam o consolo e a transformação operada pela graça providenciada na cruz. O livro não fala de nossa capacidade de resolver as coisas, mas de como Deus nos capacita e age em nós e através de nós. Somente assim os relacionamentos podem encontrar saúde, e Deus será glorificado.
A leitura é altamente recomendada, e a editora Cultura Cristã está de parabéns pela tradução e publicação da obra.

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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O pastor poeta: centenário do nascimento de Francis Schaeffer

Provavelmente mais do que qualquer outro autor, teólogo, filósofo ou apologeta, Francis Schaeffer tem contribuído para moldar o meu pensamento e prática ministerial. Este é, sem dúvida, o nome mais comentado no BJC - não por idolatria, mas por respeito e para conceder os devidos créditos a quem me ajudou a entender muitas coisas.

Vocês verão escritos sobre Schaeffer direta ou indiretamente pelo menos nestes posts: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22.

Em 2009 escrevi algo sobre o legado de Schaeffer e o seu impacto sobre mim. Eu praticamente repetiria o texto se o escrevesse hoje.

Assim, prefiro ser menos redundante, indicar os textos já escritos, e mencionar poucas contribuições recentes de minhas leituras do e sobre o autor.

1 Tenho aprendido que existem lutas que precisamos encarar como parte de nosso ministério. Schaeffer lutou contra a dislexia, a depressão, a ira, e muitas vezes com a falta de apoio e crítica de outros cristãos. Ele lidou com isso corajosamente, e sou estimulado ao perceber o seu exemplo. Aprendo que não devo fugir de minhas lutas, mas encará-las e vivê-las com a seriedade de um servo de Deus, entendendo que o Senhor está cuidando de  mim. A experiência de L'Abri em termos dos desafios financeiros, e a vivência da fé de Schaeffer e da equipe são desafiadoras e estimulantes.

Schaeffer (1912 - 1984)
2 Tenho aprendido sobre o binômio santidade e amor. Schaeffer ressalta bem em suas obras a necessidade de sermos firmes e amorosos. O caráter de Deus expressa sua santidade e justiça, ao mesmo tempo em que Seu amor e graça. Tenho visto meus irmãos calvinistas e os reformados radicais (também chamados de neopuritanos) e os arminianos e pentecostais agirem com exagerada "santidade", desconsiderando o amor - pelo contrário, massacrando e destruindo os seus oponentes, sem um desejo mais puro de ganhá-los, ajudá-los e servi-los. Tenho me visto nessa mesma situação por vezes e vezes. No outro extremo, vejo liberais, teólogos existencialistas, emergentes e o povo da teologia relacional, além dos adeptos do jeitinho brasileiro demonstrando exagerado "amor", sem considerar a santidade. São sempre carinhosos, nunca confrontando nem apontado o pecado, e assim entregam os pecadores à sua destruição. Também tenho me visto nessa situação algumas vezes. Schaeffer aponta para o equilíbio - santidade e amor: falar a verdade e as coisas duras, mas como fruto de um coração quebrantado, que deseja ver o irmão andando corretamente diante de Deus.

3 Tenho aprendido sobre engajamento cultural. Bebendo da fonte calviniana e kuyperiana, Schaeffer enfatizou o senhorio de Jesus sobre todas as áreas da vida, e assim estimulou o engajamento dos cristãos em todas as áreas da cultura. Por meio de Schaeffer, tenho sido encorajado a apreciar mais as artes, a estudar mais a política, a conhecer melhor as ciências, e a me envolver com tudo isso, reivindicando o senhorio de Jesus sobre tais demarcações. A verdade é a verdade total, e assim posso falar desavergonhadamente sobre Jesus em qualquer área. Mesmo em face do cinismo contemporâneo, da intolerância diante da religião institucional e da moral judaico-cristã, posso levantar minha voz e anunciar Jesus sem medo - Ele é senhor de tudo.

4 Tenho sido desafiado a praticar a hospitalidade. Este é um dos requisitos bíblicos para os presbíteros (pastores), mas creio que exercemos pouco ou nada fazemos. Nas leituras e exemplo de Schaeffer sou desafiado a exercer a hospitalidade de modo mais aberto e amoroso, recebendo e acolhendo pessoas - dentro e fora de meu apartamento - com um coração pronto a compreender e cuidar. Mesmo os provocadores são desafios a que expressemos amor genuíno em uma era individualizada e narcisista.

5 Tenho aprendido sobre forma e liberdade na igreja. A eclesiologia proposta por Schaeffer é bíblica e desafiadora. Ele me ajudou a compreender os elementos essenciais do culto e da igreja - do mesmo modo que qualquer defensor do princípio regulador do culto faria -, mas também me ajudou a entender que dentro da forma, existe liberdade de caminhar. Precisamos seguir a Escritura à risca em suas determinações sobre o culto, mas podemos exercer criatividade para promover outros momentos de edificação conforme a necessidade da igreja. Schaeffer nos desafia e estimula a sermos bíblicos, e ao mesmo tempo criativos - trabalhar com perguntas e respostas, interagir com as artes, entender as demandas do rebanho é tarefa pastoral. Assim sou levado a respeitar as igrejas que caminham do modo mais tradicional possível, ao mesmo tempo em que respeito as que são bíblicas em seu culto, mas promovem outras ocasiões "não tão comuns" de edificação.

Ainda há muito o que aprender. Sou grato a Deus por ter criado Schaeffer, e por hoje se completar 100 anos do seu nascimento.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Algumas razões para ser grato por minha esposa:


por ocasião de nosso aniversário de casamento

1 Sou grato por ela não ser tudo o que eu esperava de uma esposa. Deste modo Deus trata o meu coração, ajudando-me a corrigir minhas expectativas, e mostrando-me que o design dEle é bem melhor do que o meu. (Sem mencionar que, "de brinde", em conhecê-la todos os dias eu ganho surpresas melhores do que as que eu esperava).

2 Sou grato por nossas diferenças de gosto, estilo, educação, etc. É assim que Deus me livra do meu individualismo e narcisismo, abrindo os meus olhos para o outro, e fazendo-me andar em um movimento para fora de mim e em direção à minha esposa. Deus trabalha o meu coração para que eu cresça em compreensão e amor prático, lidando com as diferenças. Deus quebra o meu egoísmo e idolatria, ajudando-me a servi-la em itens e momentos não interessantes para mim. Além disso, eu aprendo sobre novas perspectivas do mundo, e com os seus gostos e estilo eu percebo novas interpretações da realidade que enriquecem minha experiência.

3 Sou grato por seu jeito feminino e as manifestações de pecado envolvidas nele (Gn.3 - manipulação emocional, tentativa de controle, etc.). Deste modo Deus me desafia a um tipo de liderança no lar que resgate o ensino bíblico sobre a vocação do homem, e me encoraja a pensar e praticar formas criativas e amorosas de conduzir minha esposa com firmeza e sensibilidade. Deus me ensina a ser homem diante das nossas manifestações de pecado.

4 Sou grato por nossos conflitos.  Cada discussão e desentendimento é um exercício de amor sacrificial. Assim Deus me ensina a amar minha esposa como Jesus amou a Igreja e se entregou por ela (Ef.5). Nossos conflitos são dolorosos e difíceis, mas são grande oportunidades para compreensão mútua e crescimento no amor e na graça de Deus. Cada desentendimento é um momento para abrir mão das "vitórias e conquistas pessoais", e buscar honrar a Deus por meio de servir o outro. Nem sempre servir significa permitir que o outro faça o que quiser, mas significa que o amor direciona as atitudes. Deus me ensina a pastorear a minha amada em nossos problemas, e demonstra os pecados e ídolos do meu coração - ensinando-me sobre o tanto que ainda preciso mudar para ser um marido adequado.

A gente se diverte!
5 Sou grato por sua doçura e feminilidade. Deus alimenta os meus olhos e coração ao me permitir ver e ouvir seus olhos, suas curvas, sua voz, seu perfume e seu jeito. O Senhor me preenche de amor e desejo de cuidar e guardar minha esposa de todas as maneiras possíveis. Deus me ensina que ela é filha dEle, e que eu sou Seu mordomo em cuidar dela. Agora mesmo ela está cheia de planos e idéias para celebrarmos o nosso aniversário de casamento logo mais. Ontem ela estava belíssima em um vestido longo e com o cabelo cortado. Seu jeito feminino me enriquece e alegra.

6 Sou grato por sua coragem e força. Mesmo sendo o vaso mais frágil (1 Pe.3.7), minha esposa possui coragem e força. Saiu de sua cidade para me acompanhar, abriu de seus empregos em Brasília para viver sob o meu sustento (mesmo que ela ainda trabalhe hoje), e prontificou-se a experimentar várias situações inteiramente novas em decorrência do casamento (mudança de igreja, de casa, de nome, etc., etc.). Sua força e coragem me desafiam a ser um homem melhor e mais digno da mulher que ela é.

7 Sou grato por nossa afinidade com a área teológica. Amo o fato de ela amar teologia e se envolver nisso tanto quanto eu. Sou profundamente agradecido por podermos assistir um filme e discutir sobre as cosmovisões nele apresentadas, ao mesmo tempo em que nos divertimos com as cenas mais bobas do mesmo. Agradeço a Deus porque o seu envolvimento com a área lhe faz compreender alguns dilemas do ministério pastoral e me apoiar nisso tudo com especial propriedade.

8 Sou grato por crescermos juntos em uma mentalidade voltada para o coração. Através do Centro de Pós-graduação Anrew Jumper (CPAJ) tivemos acesso a materiais e leituras que direcionaram a nossa perspectiva de Deus, dos homens e dos relacionamentos. Hoje crescemos juntos nessa mentalidade voltada para o coração, analisando nossos ídolos e motivações, e assim tendo uma prática matrimonial enriquecida, e que nos permite ajudar outras pessoas. Não bastam transformações comportamentais, ou ambientais, a dimensão do coração é mais profunda. Estamos crescendo nesse entendimento.

9 Sou grato por sua simplicidade. Minha esposa não exige muito para viver. É uma mulher simples e amável, que experimenta o contentamento sem muita dificuldade. Isso conforta o meu coração diante das possibilidades de prover para o lar, e diante dos nossos desafios orçamentários. Ao mesmo tempo, sua falta de exigências me desafia a lutar por crescimento, para oferecer a ela cada vez mais e melhor, para a glória de Deus, e para o seu cuidado.

10. Sou grato por nosso primeiro ano juntos. Muitas foram as experiências, encontros, desencontros, sorrisos, choros, palavras e silêncio. Deus nos supriu em cada momento. Deus recompensou o nosso amor - como o Rev. Wadislau diria. Deus alimentou o nosso amor. E Deus glorificou o Seu nome em nossa união. Aprendemos cada vez mais a viver com base na aliança, e isto é libertador.

Minha linda, sou grato por você. Grato principalmente a Deus, que dirige nosso caminho, e a você também.

Amo você, Ivonete Porto.

A Deus toda a glória.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Ele não está tão a fim de você

Aí vai um artigo sobre o filme "Ele não está tão a fim de você", dirigido por Ken Kwapis.

Para baixar o PDF, basta clicar aqui.

A análise é produto dos encontros chamados Pipoca&Bíblia, na Igreja Presbiteriana do Araçagy, onde sentamos para assistir filmes e discuti-los a partir da Bíblia.

O artigo será postado por lá, em uma série.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O melhor de 2011 em música

Eis algo novo. Nunca havia listado os melhores do ano na categoria música. Talvez pela dificuldade em selecionar algo. Em 2011 aprendi um pouco mais da riqueza dos clássicos como Handel e Bach, mas como não os desfrutei suficientemente, ficarão fora da lista [embora estejam em uma lista eterna].

O que vai abaixo é uma tímida seleção, não do que foi lançado neste ano, mas do que descobri e curti, ou do que revisitei e percebi riqueza, enfim, expressões de beleza que alimentaram de algum modo minha alma. Selecionei apenas 12 para ficar algo proporcional aos meses do ano, e para que a lista tivesse fim (eu continuo lembrando de nomes). Mas agora já foi. O que está por aí fica. Os outros podem ser comentados em outras ocasiões.

Aproveitem.

1. Ebinho Cardoso
O melhor baixista que conheço. Sua música é rica de sentimento e me leva às lágrimas. Ebinho eleva o baixo a outros níveis, explorando o instrumento em suas diversas potencialidades, e trabalhando nele a harmonia de modo mais pleno. A música Ruanda está entre minhas preferidas.

2. Andy McKee
O que falei de Ebinho no baixo pode ser dito de Andy McKee no violão. Conheci-o através de "Rylynn", que me derrubou fácil. A sonoridade que tira do violão é singular. Cada nota vem com mais significado e sentimento.



3. Andrew Peterson
Não lembro como conheci Andrew Peterson, mas com certeza foi um dos melhores sons de 2011. O seu estilo meio folk/country me soa muito suave e belo. Mas não apenas isso: Peterson é um músico, compositor e escritor profundamente influenciado por C. S. Lewis. Desse modo, consegue transpor para suas canções a beleza de letras que acompanham linhas melódicas envolventes. O CD "The Far Country" é um trabalho conceitual sobre o céu - belíssimo!

4.  Palavrantiga
Palavrantiga me lembra da consistência de Peterson. Pensam, compõem e cantam sob a influência kuyperiana/rookmakeriana e fazem um "hope rock" agradável e significativo. É uma das bandas que me dão esperança no meio cristão. "Rookmaaker" é um  dos hits que talvez você já conheça!

5. Sovereign Grace Music
Eis o que todo grupo de louvor deveria ouvir e aprender. SGM é a equilibrada junção de música envolvente, bela, verdadeira, e cautelosa em sua teologia. A equipe de louvor canta salmos, orações puritanas, e temas teológicos com criatividade e excelência, com um som bastante autêntico - sem cair nas fórmulas dos grupos de louvor de sucesso. Recomendo o CD "Risen".



6. Sojourn
Descobri o Sojourn logo após o Sovereign Grace, por indicação de meu primo. Seguem um princípio em comum - boa teologia e criatividade. Sojourn soa mais como banda, sem foco em músicas congregacionais, mas o modo como envolve os elementos eletrônicos em suas canções é algo impressionante. Vale a pena conhecer! A música "How Long", do álbum "Over the grave" é demais!

7.  John Mayer
John Mayer me trouxe alegria musical logo no início do ano. Eu buscava algo interessante, e o seu DVD "Where the light is" apareceu na hora certa. Sua levada como instrumentista é boa demais, e ele transita muito bem entre o pop e o blues.

8. Johnny Lang
Junto com Mayer, Lang me fez reencontrar a beleza do blues. "Lie to me" deixou as melhores impressões sobre este cantor/instrumentista. Sua voz "rasgada" encaixa perfeitamente no som.

9. Wanda Sá
Não conhecia esta cantora cristã que faz um maravilhoso som. Com a suavidade da bossa, e uma grande voz, ela passeia entre canções com propriedade e sutileza. Sua releitura de "Ame ao Senhor" me derrubou.



 10. Tanlan
Tive a oportunidade de conhecer os caras do Tanlan aqui em SanLu. Seu som é agradável, e sua visão cristã é consistente. Fogem dos clichês, e isso me agrada bastante. Foram mencionados como produto dessa "nova safra" de música cristã, que, com Palavrantiga, Eduardo Mano, etc., traz um som mais apurado, e um conteúdo mais pensante.

11. Thalles
Thalles é um pentecostal ou neo, que tem uma bela voz. Discordo de elementos de sua teologia, mas ao ouvir suas canções não posso deixar de apreciar a sonoridade. Seu cd "Na casa do Pai" é muito bem produzido.

12. Dr. Sin
Voltei a ouvir Dr. Sin recentemente. Não se assustem com o nome. A banda conta com o famoso guitarrista Eduardo Ardanuy, e no seu som pesado traz harmonia e boas levadas de baixo e guitarra. "Sometimes" é demais.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Os melhores livros de 2011

Normalmente faço uma lista dos 10 livros que eu mais gostei no ano. Dessa vez decidi fazer diferente. Percebi a variedade de categorias, e a utilidade de trabalhar os melhores livros dentro dessas categorias. Talvez posteriormente eu faça a lista dos 10, mas os livros que vão abaixo já cumprem perfeitamente o papel.

Também não conseguirei fazer comentários, dada a variedade de obras. De todo modo, acredito que preciso voltar a fazer resenhas de cada lido livro ao longo do ano.


Fora da lista, eu apenas faria menções honrosas aos livros "Just do something", da ed. Moody Publishers; "A igreja na cultura emergente", da Editora vida, "Em defesa do casamento", também da Vida, "Por que ser a favor da vida?", da Arte editorial, e "O manual do peregrino moderno", da Ed. Ecclesiae.

Também menciono todo o material de Francis Schaeffer lido neste ano: "A igreja diante do mundo que a observa"; "The great evangelical disaster"; "A igreja no final do século 20"; "Morte na cidade"; e "Josué e a História bíblica" (na lista abaixo). Todos são da ed. Cultura cristã, com exceção do título em inglês.

Vocês verão que alguns títulos se repetem, sendo considerados os melhores em categorias diferentes. Isso é intencional.

Deste modo, recomendo fortemente a leitura do material abaixo. Leiam a lista, e aproveitem. Se você deseja adquirir algum livro desses e não sabe como, entre em contato.

 CategoriasTítuloAutorNum de PgsEditora
      
1AconselhamentoAprendendo o contentamento em todas as circunstânciasRobert Jones34Nutra
2ApologéticaMorte na cidadeFrancis Schaeffer103Cult. Cristã
3ArtesA arte não precisa de justificativaHans Rookmaaker76Ultimato
4BiografiaSchaeffer: an authentic lifeColin Duriéz240Crossway
5ComédiaNotas de um comediante stand-upLéo Lins160Nossa Cultura
6CosmovisãoMorte na cidadeFrancis Schaeffer103Cult. Cristã
7DevocionalOração: cartas a MalcomC. S. Lewis157Vida
8EclesiologiaPor que amamos a igrejaDeYoung/ Kluck243Mundo Cristão
9EnsaiosContra um mundo melhorLuiz Felipe Pondé215Leya
10EntrevistasConversas no caféV. A.194Nossa Livraria
11FilosofiaO imbecil coletivo IOlavo de Carvalho632É realizações
12Filosofia - estéticaAdão no paraíso e outros ensaios de estéticaOrtega Y Gasset119Cortez
13HistóriaO que todo presbiteriano inteligente deve saberAlderi / Adão Carlos208SOCEP
14LiderançaO pastor como mestre e o mestre como pastorPiper / Carson133Fiel
15Literatura - AlegoriaO peregrinoBunyan254Mundo Cristão
16Literatura - TeatroOteloShakespeare186pdf
22MissõesCompletando as aflições de CristoPiper142Shedd Public.
17PneumatologiaCheios do Espírito SantoAugustus N Lopes86Vida
18PolíticaO imbecil coletivo IOlavo de Carvalho632É realizações
19Teologia BíblicaJosué e a História BíblicaFrancis Schaeffer176Cult. Cristã
20Vida cristãSexo não é problema, lascívia simJoshua Harris123Cult. Cristã

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

BJC: 6 anos

aos 6.
Hoje este blog completa 6 anos. Tempo razoável para quem surgiu sem muitas pretensões. Em minha curiosidade, fui em busca de como eu era nessa idade. Os registros de minha mãe relatam que, aos 6, participei de minha "formatura do abc", tendo sido o orador; identifiquei uma doença que carrego para sempre (traços de anemia falciforme), e tinha algum interesse teológico.

Não sei quantos paralelos são possíveis entre a minha história e a do BJC, e também não pretendo alegorizar demais. Mas gosto de notar que ambos comemoramos 6 anos envolvidos nas letras, ambos tivemos alguma participação cultural, e ambos estamos ligados à teologia. Eu poderia ter esses itens, mas não manifestá-los no blog. Como é bom ver que as coisas caminham junto! Afinal, A Bíblia, o Jornal e a Caneta, podem, assim, ser percebidas como itens de minha existência, e não apenas um elemento fictício para posar na internet.

Meu discurso como orador na formatura do ABC,
escrito por minha mãe, Iris Porto.
Ao longo deste ano os posts foram menos frequentes, porém mais significativos. Dentre os 5 mais lidos ao longo de toda a história do BJC, 2 ou 3 foram produzidos em 2011. As visitas tiveram grande contribuição daqueles que me recomendam, especialmente o ipródigo, o voltemos ao evangelho, o ivonetirinhas, e a norma braga. As redes sociais como o twitter e o facebook também tiveram grande participação em tornar o blog visível.

Isso significa que, se houve crescimento, não é exclusivamente fruto de meu trabalho, ou mesmo da qualidade dos textos aqui postados, mas também da parceria de irmãos que pensam junto algumas questões, e, acima de tudo, da graça de Deus, que ainda traz pessoas aqui para ler desabafos, reflexões, e provocações.

Já mencionei que o nome do blog surgiu quando eu ainda nem compreendia bem o significado dessa relação. Mas uma criança de 6 anos já consegue fazer conexões, e mais do que nunca tenho buscado uma postura autoconsciente no BJC: tratar do link entre a Bíblia e a cultura, e manifestar a realidade da existência de Deus e a veracidade de Sua Palavra para o homem do nosso tempo.

Relatos de minha infância
Aos 6, eu perguntei aos meus pais: "ainda existe sacerdote em Israel?". Muitos anos depois eu viria a aprender sobre o sacerdócio universal de todos os crentes, e o impacto disso para a minha vida.

Desejo que o BJC manifeste esse sacerdócio, e que venham mais aniversários, para que, com eles, o blog creça em maturidade e graça, para a glória de Deus!



segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Uma palmada do Estado


A vara e a disciplina dão sabedoria, mas a criança entregue a si mesma vem a envergonhar a sua mãe. [...] Corrige o teu filho, e te dará descanso, dará delícias à tua alma.

Provérbios 29.15,17

 

Na última quarta-feira o projeto de lei 7.672/2010, conhecido como “a lei da palmada”, foi aprovado por unanimidade na comissão especial da Câmara dos Deputados. Ao que parece, a bancada evangélica teve tímida participação no processo mais amplo de discussão do projeto. Conforme matéria da Folha.com, possivelmente tal bancada sugeriu a troca do termo “castigo físico” por “agressão física”, mas os representantes dos direitos da criança e do adolescente não gostaram da idéia, e assim ficou o termo “castigo corporal”.1

Por meio deste projeto, o Estado pretende regular a esfera da família, controlando o exercício da disciplina e correção por parte dos pais. Seria isso legítimo?

 

A igreja e a manipulação cultural

Em 1970 o pastor Francis Schaeffer2 escreveu sobre a percepção da igreja diante das formas de manipulação possíveis. Para ele, era necessário atenção e sabedoria.

 

Não há dúvidas de que o futuro se encontra aberto para manipulação. Quem a fará? Será uma nova elite institucional partidária de um governo autoritário ou outra elite? Quem obtiver poder político ou cultural no futuro terá à sua disposição técnicas de manipulação que nenhum governante autoritário jamais teve. Nenhum desses recursos é apenas futuro; todos eles já existem hoje e estão à espera de serem empregados pelos manipuladores.

 

Schaeffer lista os itens de controle então percebidos: a manipulação científica; da lei; da História; na religião; no teatro e nas artes; na TV; e a manipulação química. Aquilo que foi descrito há 40 anos hoje é realidade presente.

No caso específico da discussão a respeito da disciplina física às crianças, temos a manipulação da televisão, com ênfase exagerada nos pais que abusaram da força na correção, e nenhuma menção a todas as demais crianças que foram beneficiadas com a “palmada”. Celebridades, como a Xuxa, mostram o rosto para apoiar a causa. A manipulação científica também é facilmente percebida. Os ativistas dos direitos da criança e do adolescente normalmente recorrem a algum “cientista de renome”, seja médico, psicólogo, pedagogo ou alguém semelhante, para validar a idéia de que exercer a correção física sobre a criança promove traumas e outros males. As formas de manipulação estão diante de nós. Que faremos?

 

Um breve diagnóstico

 

Uma observação rápida levanta questões e observa problemas no processo de aprovação deste projeto de lei. Primeiramente, seguindo uma perspectiva calvinista, especialmente nos termos de Abraham Kuyper3, há um grande problema em ver o Estado interferindo na esfera da família. O Estado possui uma esfera própria de atuação, que não envolve diretamente o controle das liberdades individuais e familiares. Assim como a esfera do Estado, a da família presta contas diretamente a Deus, e exerce nível próprio de soberania. O Estado não é nosso pai, mãe, ou babá. Deus criou pais e mães para os indivíduos.

Em segundo lugar, enquanto a idéia de um Estado excessivamente intervencionista é preocupante (não apenas na economia, mas agora na vida familiar), percebe-se, em nível mais específico, a manipulação da lei descrita por Schaeffer. Se, por meios legais, o comportamento dos pais diante de seus filhos for determinado, estamos submetendo uma série de princípios bíblicos a outra autoridade, e com isso, violando a lei do Altíssimo.

É necessário falar também da apatia evangélica diante dos caminhos tomados política e culturalmente. A bancada evangélica age com timidez e desconsidera elementos mais básicos da Escritura. Mas não só ela: no resto de nosso país há silêncio e alienação por parte dos evangélicos.

Finalmente, há os que falam. Mas estes estão tomados, em grande medida, pelo que pode ser chamado de “conservadorismo vazio”. Alguém levanta a pergunta: - é certo bater nos filhos? E eles respondem com algum tipo de agumento baseado exclusivamente na tradição, como se ela fosse autojustificada.

Perceber esses itens nos leva a concluir três graves problemas entre os evangélicos: (1) Nossa inabilidade de lidar com o texto bíblico; (2) Nossa incapacidade de pensar os eventos em seu contexto mais amplo; e (3) Nossa incapacidade de fornecer respostas sólidas e fundamentadas às questões do nosso tempo.

 

A articulação necessária

Podemos seguir estes problemas como um roteiro para a resposta sábia. Partimos da fonte última de autoridade: Deus e Sua Palavra. O texto de Pv. 29.15,17 estabelece pontos relevantes para a discussão sobre a disciplina dos filhos.

O autor dos provérbios estabelece uma relação de causa e efeito entre o uso da “vara” - a disciplina física – e o crescimento em sabedoria. O argumento é claro: disciplinar o filho o tornará mais sábio. Usando outro caminho, o autor revela que não exercer a correção é o mesmo que entregar o seu filho a si mesmo – o que é considerado abandono. Aqui temos uma lógica interessantíssima: os ativistas contemporâneos lutam contra o abandono, mas segundo a Escritura, o que fazem ao apoiar este projeto de lei é promover este mesmo abandono das crianças. Você deseja ter um filho sábio que não se sinta abandonado?

No versículo 17, a correção é vista como fonte de beleza e satisfação. Os pais que corrigem seus filhos os livrarão de práticas piores, e alimentarão beleza e graça em seu relacionamento. Deus ensina que o “castigo corporal”, administrado segundo a Sua Palavra, é algo bom e proveitoso para todos: o próprio Deus, os pais, os filhos e a sociedade.

No corpo dos princípios e ensinamentos bíblicos, podemos perceber pressupostos estabelecidos, ao utilizar termos como disciplina e correção, como a realidade de elementos morais e epistemológicos, como certo e errado, justo e injusto, verdadeiro e falso.

Caminhando no roteiro, chegamos à necessidade de uma compreensão mais abrangente dos eventos à nossa volta. O que está envolvido na aprovação deste projeto?

Algo já foi mencionado. O cristão, e o [cristão] reformado, mais especificamente, possui forte bagagem bíblica, teológica, filosófica e histórica para se contrapor à noção de um Estado que interfere em esferas fora de sua alçada. A perspectiva mais ampla segue o raciocínio: se o Estado cresce a cada dia, tomando para si áreas que era de responsabilidade exclusiva dos indivíduos e famílias, o que o impedirá de continuar crescendo, e atingindo outras áreas? O que o impedirá de um controle final e absoluto sobre a vida dos cidadãos, sobre as famílias, e sobre as religiões?

Alguém poderá contra-argumentar, afirmando que existem direitos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal, mas acredito que se trata de uma resposta ingênua. A filosofia do Direito que hoje rege as faculdades e tribunais é uma que exclui Deus. O direito agora é percebido exclusivamente de maneira sociológica: as transformações sociais promovem as transformações jurídicas. Deste modo, cabe ao judiciário, mais do aplicar a lei, interpretá-la conforme os novos tempos e práticas. Foi assim que o STF violou a Constituição no recente caso da união de homossexuais. Por que não voltaria a fazer o mesmo em outras áreas? A Constituição não é mais algo objetivo, mas sujeito às interpretações de pessoas cuja cosmovisão acompanha uma filosofia que exclui Deus.

O tom alarmista não deve nos assustar. Não se trata de uma tentativa de amedrontar, mas de nos fazer pensar, orar, e agir na cultura de modo consistente. A apatia evangélica pode ter resultados sérios.

O último item de nosso roteiro é a necessidade de uma resposta sólida e consistente, argumentos fundamentados que não manifestem um conservadorismo vazio. As respostas comuns têm alimentado o ceticismo, o cinismo, e as abordagens contrárias à disciplina física. Quando perguntados, ou comentando o caso da disciplina, os conservadores vazios respondem: “sempre foi assim”; ou “está na Bíblia”; ou ainda “meu pai fez assim e nem por isso eu morri”. Todas estas respostas, mesmo a da Bíblia, refletem a ausência de uma reflexão honesta sobre o caso, e a incapacidade de articular e fornecer respostas sábias e fundamentadas. Simplesmente dizer que está na Bíblia não fala nada ao homem do nosso tempo, é preciso explicar o que é a Bíblia, a sua autoridade, e o modo como a Escritura trabalha o tema. As demais respostas também são inúteis, e fazem os outros se afastarem ainda mais da abordagem da correção física. Afinal, nem os seus defensores sabem o porquê disso.

Deste modo, podemos oferecer uma resposta melhor fundamentada, articulando a Escritura, a história, a tradição, e pensando a disciplina adequadamente. Sugiro a combinação das cinco proposições abaixo:

 

1. A Bíblia estabelece uma relação de causa e efeito entre a disciplina e a sabedoria. Considerando a Bíblia como Palavra de Deus, e portanto, autoridade absoluta e inerrante, Deus institui a correção física. Não apenas isso, mas o Senhor ensina que o castigo corporal promove a sabedoria nas crianças. Se desejamos o seu bem, a disciplina precisa ser considerada.

2. A disciplina trabalha categorias morais na criança. Por meio da correção, a criança é exposta a um conjunto de categorias morais, e aprende sobre a existência do que é certo e errado. A aquisição destas categorias de pensamento ainda na infância são fundamentais para um crescimento equilibrado, e uma vida ajustada nas idades mais avançadas. Os indivíduos cujas categorias morais são distorcidas caem na corrupção, na criminalidade, e em erros de várias outras naturezas. Além da compreensão de certo e errado, a criança disciplinada aprende sobre o que é justo e injusto. Ao desobedecer pai e ser corrigida, ela compreende que é um ato de justiça exercer disciplina sobre quem desobedeceu leis. Novamente, isso tem grande impacto sobre a formação da criança, e sua caminhada na infância e na vida adulta. Sem o aprendizado das categorias de justiça e injustiça, tal criança pode ser tornar um pai que abusa da força na disciplina de seu filho, ou um homem que age injustamente na cultura de várias maneiras.

3. A disciplina trabalha categorias epistemológicas na criança. O desdobramento da aquisição de categorias morais, é a percepção de categorias epistemológicas fundamentais. Se existe certo e errado, justo e injusto, a criança, também perceberá que existe o verdadeiro e o falso. O gesto da mentira será disciplinado. Ao ser desobedecida, a mãe que ordenou algo demonstrará que estava falando a verdade ao anunciar que o erro seria punido. Na cultura contemporânea, a noção de verdade é atacada, e talvez um relativista do nosso tempo não pense que este item seja bom. Mas novamente precisamos pensar em termos amplos. É fundamental que uma criança aprenda tais categorias epistemológicas, sob pena de ter seu crescimento e formação comprometidos. Se não há verdade e mentira, por que colocar uma criança na escola? Se não há verdade e mentira, por que pagar um funcionário após um mês de trabalho? Se não há verdade e mentira, por que um piloto de avião não muda todos os procedimentos a 33.000 pés de altura? Uma criança sem tais noções não terá capacidade de aprender, de se comunicar, nem de confiar ou ser confiável.

4. A disciplina previne e prepara a criança para a vida. Para além das categorias morais e epistemológicas mencionadas nos itens anteriores, a prática da correção livrará a criança de cometer o mesmo erro em outras situações, e a protegerá de cometer vários outros erros na vida. Tudo tem origem naquela palmada da infância.

5. A disciplina manifesta amor. Novamente recorremos a nossa fonte de autoridade: Deus e Sua Palavra. Em Hebreus 12.6, é o próprio Deus cristão que anuncia: “[...] o Senhor corrige a quem [Ele] ama”. O texto trata da questão da paternidade de Deus, e o modo como Ele ensina Seus filhos. Jesus conjuga disciplina e amor. Os ativistas argumentam que a correção é mera expressão de ira e autoritarismo, mas aqui somos confrontados com outra realidade. Queremos expressar amor por nossas crianças tanto quanto estes ativistas, porém entendemos que exercer a correção é parte dessa expressão de amor. Não podemos ser privados disso. Amamos demais nossas crianças para não corrigi-las.

 

Para um diálogo contínuo

Estes cinco itens, corretamente compreendidos e articulados, fornecem uma boa resposta aos questionamentos levantados sobre a lei da palmada e seus desdobramentos, mas ainda cabe um item de reflexão.

O cristão não é utópico, nem pessimista, mas realista. Fugindo da utopia, não pensamos que todos os pais que batem em seus filhos o fazem adequadamente. Exatamente por isso a Escritura ensina que os pais não devem disciplinar a criança de modo exagerado (Efésios 6.4). Não somos ingênuos, e queremos protestar junto com os ativistas contra o exagero e abuso de alguns pais. Violentar, maltratar e agredir uma criança é algo desumano e contra a Lei do Senhor.

Por outro lado, estamos distantes dos ativistas porque não pensamos com o pessimismo deles. Não entendemos que todas as manifestações de castigo corporal são abusivas e destrutivas. Pelo contrário, fundamentados na Palavra de Deus, entendemos que é possível bater na criança de modo amoroso, para o seu bem.

Assim, o cristão se encontra num lugar de equilíbrio e realismo. Contra o abuso e a ausência de disciplina, lutamos para que a Palavra de Deus seja cumprida, e assim nossas crianças tenham a melhor formação possível, sendo disciplinadas quando cometem erros, para que sejam pessoas melhores, e assim Deus seja glorificado no enriquecimento da sociedade, composta por indivíduos corretamente formados.

A Deus toda a glória.

 

1Lei da Palmada é aprovada por unanimidade em comissão da Câmara. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/1021280-lei-da-palmada-e-aprovada-por-unanimidade-em-comissao-da-camara.shtml>. Acesso em: <18, Dez. 2011>.

2SCHAEFFER, A igreja no século 21. São Paulo: Cultura Cristã, 2010. p. 79. O livro em questão é uma coletânea de obras do autor. A citação é da obra “A igreja no final do século 20”.

3Abraham Kuyper foi primeiro ministro da Holanda, além de pastor, jornalista, fundador da Universidade Livre de Amsterdã e do partido anti-revolucionário. É conhecido pelo conceito de soberania das esferas, no qual existem esferas criadas por Deus, que possuem soberania própria e não devem interferir umas nas outras. A família é uma destas, e o Estado outra. Cf. KUYPER, Abraham. Calvinismo. São Paulo: Cultura Cristã, 2002. p. 85-113.

sábado, 17 de dezembro de 2011

1 ano como pastor da IPB


Hoje completo um ano de Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB). Desde que nasci, até os 25 anos de idade, participei da igreja batista, tendo sido ordenado pastor dessa denominação em 23 de maio de 2010. No dia 10 de dezembro, contudo, saí do campo batista, e fui recebido pela Igreja Presbiteriana do Brasil (Presbitério Leste do Maranhão) em 17 de dezembro de 2010.
Eu poderia escrever um texto sentimental - como outros que já fiz sobre o assunto. Dessa vez quis algo diferente. Correndo o risco de soar narcisista, farei a primeira auto-entrevista do BJC.

* * *

Uma conversa com Allen Porto. Por Allen Porto.

No mesmo canto de sempre, de frente para a parede, quase como uma criança de castigo nos velhos tempos, ele se sentou para perguntar e respoder. Na cabeça, um pouco de dúvida sobre a seriedade daquilo, mas não custava tentar. Não queria deixar a data passar em branco, além de explorar possibilidades novas de escrita. Foi assim que o bate-papo teve início.

BJC: Dizem que apenas os loucos falam consigo mesmo, correto?

Allen: Dizem, mas eu discordo. Lembra do salmista falando consigo na Escritura - "por que estás abatida, ó minh'alma?"? (Sl.42.5). Para o salmista era o contrário da loucura, era um exercício de manutenção da lucidez.

As mãos pararam sobre o teclado. A idéia de um diálogo consigo para manter a "saúde mental" era interessante ao entrevistador-entrevistado. Mas o bate-papo precisava continuar.

BJC: Você sabia que, além deste aniversário do pastorado na IPB, hoje também é o dia do pastor presbiteriano?

Allen: Sei, e acho um belo arranjo. De alguma forma tornou mais significativa essa data para mim, ao mesmo tempo em que me livra do egoísmo - todas as vezes que eu lembrar de meu aniversário como pastor da IPB, terei de lembrar de todos os outros pastores, que comemoram o seu dia nesta data. É mais uma agradável surpresa de Deus, equilibrando o indivíduo e a comunidade para a Sua glória. (Aproveito para dar os parabéns aos meus colegas de ministério!).

Minha ordenação na igreja batista
BJC: Como se deu o processo de transição da igreja batista para a IPB?

Allen: Eu nasci na igreja batista. Meu pai era pastor batista, e assim eu cresci naquela tradição. Fiquei na mesma igreja - a Batista Getsêmani - por praticamente 18 anos. No fim dos 16 e início dos 17 eu conheci a fé reformada e abracei esta perspectiva. Infelizmente, por falta de sabedoria minha e de meus irmãos, ganhei alguns conflitos por isso. Ao fim dos 17, início dos 18 eu comecei a faculdade de comunicação, o seminário teológico, e me tornei membro da Igreja Batista Monte Carmelo - na época, a única igreja batista declaradamente de confissão reformada em São Luís. Os anos que passei lá foram marcantes: comecei a transição da música para o púlpito, fui treinado para exercer um papel mais estratégico conforme outras habilidades que Deus estava me concedendo, e continuei o processo de revisão teológica pelo qual estava passando desde o início do ano anterior. Descartes fala de "derrubar o edifício para começar do zero" - eu não cheguei a tanto, mas passei perto. Submeti à dúvida e à revisão teológica muito do que eu havia simplesmente assimilado ou pressuposto como verdade. [Obviamente eu não tenho a pretensão de "certeza"e controle racional como o filósofo]. Foram anos intensos de confirmação de doutrinas, abandono de idéias erradas, e muito aprendizado. Alguns anos depois, por uma série de desdobramentos que teve início com a família, tornei-me membro da Igreja Batista Renascença, onde fiquei por praticamente seis anos (2005 - 2010). Ali também aprendi bastante, especialmente com o contato que tive com vários pastores - Alzugaray Pinheiro, Vanduides Cristovam, Michael Nichols e Carlos Menezes. Concluí o seminário em 2005, mas fiquei lutando com a idéia de ser vocacionado até 2008 ou 2009. Eu não queria ser pastor. Finalmente entendi que Deus havia me chamado para isso, e conversei com os meus líderes. O processo levou uns 2 anos até que fui ordenado na igreja batista. No entanto, ao longo desse período, eu percebia como a teologia reformada faz diferença no ministério. Assim, passei por alegrias e frustrações naquela igreja, mas exercendo o serviço de modo que o processo iniciado lá em 2008 ou 2009 culminou em minha ordenação ao ministério pastoral na igreja batista. Pastoreei durante aquele ano, até que surgiu o convite da Igreja Presbiteriana do Renascença para integrar a equipe ministerial de lá, bem como para plantar uma nova igreja em São Luís. O processo de transição foi tranquilo, e em dezembro eu participava da reunião do Presbitério Leste do Maranhão, para ser avaliado e recebido. A igreja batista me enviou em paz, e a igreja presbiteriana me recebeu muito bem. Sou grato por toda a trajetória.

BJC: Você acha que foi honesto na ocasião, tendo sido ordenado e logo saindo para a IPB?

Allen: Sim. Houve quem interpretasse como desonestidade de minha parte - como era possível uma mudança de convicções tão rápida? Mas esta é uma análise superficial da situação. Como falei, eu estava comprometido com a fé reformada desde 2002 (fim dos 16, início dos 17), e assim partilhava de muitos pontos em comum com os irmãos presbiterianos. Além disso, o seminário que cursei se chamava Instituto Superior de Teologia Reformada. Tratava-se de uma instituição fundada e mantida por pastores presbiterianos - hoje meus colegas de presbitério. A minha perspectiva era a de um batista reformado, pura e simplesmente. Deste modo, eu poderia muito bem caminhar na igreja batista, e pensar de maneira "diferente" do mainstream. A diferença, então, ficava basicamente por conta da forma de governo, e dos sacramentos. No meu exame com os pastores batistas - a "sabatina teológica"- demonstrei que a compreensão presbiteriana do batismo não era algo escandaloso para mim - pelo contrário, eu compreendia a validade do argumento aliancista, e reconhecia que era consistente. Falei tudo isso claramente, e ainda assim fui ordenado pastor batista. Não escondi nada de ninguém, e nem os pastores batistas acharam problemas nisso. A questão do governo era secundária, como ainda penso hoje. Ela tem sua importância em termos administrativos, e precisa representar fidelidade aos elementos bíblicos - a presença de presbíteros e diáconos, ainda que se queira dar outro nome -, mas penso que há liberdade para as denominações terem sua forma de governo. Por isso, eu tinha consciência tranquila de que poderia ser um pastor batista, e que não estava distante dos presbiterianos. Talvez a grande questão seja que, para o observador de fora, é necessário uma grande transformação de mentalidade para alguém deixar de ser batista e se tornar presbiteriano. No meu caso não houve. Creio que Deus trabalhou comigo de modo gradual, desde 2002, de modo que em 2010 - 8 anos depois - os conceitos estavam consolidados e eu poderia mudar sem grandes crises ou rompimentos bruscos.

Os olhos repassam a resposta, e as mãos ansiosas sobre o teclado se prontificam a reescrever qualquer linha. O assunto já causou polêmica, é melhor escrever com cautela.

BJC: Algum arrependimento nesse processo?

Allen: Nenhum. Pelo menos não que eu lembre. Não quero dar a impressão que não cometi erro algum, porque é possível e provável que alguma coisa eu tenha feito de errado. Mas ao mesmo tempo eu creio que Deus conduziu a transição de modo tão perfeito, que eu não consigo imaginar algo que poderia ser melhorado.

BJC: E a recepção na IPB? Como se deu?

Allen: Aqui precisamos analisar de dois modos. No presbitério eu passei por todos os procedimentos adequados, como uma nova sabatina teológica - duas no mesmo ano! - e a pregação. Como muitos dos pastores ali haviam sido meus professores, e outros era meus amigos, fui recebido muito bem. O segundo caso é o da igreja local - a Igreja Presbiteriana do Renascença. Falo em "modos" diferentes porque primeiro fui recebido no presbitério, e depois designado pastor auxiliar da IPR. Mas ali também fui muito bem recebido. A igreja me conhecia pelo menos de rosto, porque desde 2003 eu participava anualmente do Encontro da Fé Reformada - que na época ainda nem tinha esse nome. No último ano fiquei ainda mais próximo, dando palestras e pregando algumas vezes naquela igreja. Os irmãos me receberam muito bem e até hoje me sinto bem acolhido.

BJC: Você consegue notar alguma diferença entre ser pastor na igreja batista e na IPB?

Allen: Não posso falar de modo genérico, porque desconheço a realidade de outras cidades e estados, mas noto grande diferença em termos de liberdade para trabalhar a partir dos pressupostos reformados. Infelizmente, na igreja batista eu fazia um duplo esforço - o de lutar por um lugar para a perspectiva reformada, e então poder ensinar algo dela. Gastava-se mais energia até chegar ao ensino ou ministério propriamente dito. Na IPB a experiência tem sido diferente: por haver um compromisso institucional com a cosmovisão reformada, o ministério tem "fluído" mais tranquilamente. Não quero dar idéias erradas: não demonizo a igreja batista, e nem "romantizo" a presbiteriana: a minha experiência foi desta maneira, mas posso citar o exemplo de igrejas como a Batista da Graça, em São José dos Campos, na qual o ministério brota da abordagem reformada sem problemas. Ao mesmo tempo, sei que é possível um pastor presbiteriano ter dificuldades para exercer o ministério reformado em alguma igreja com maior influência arminiana, pentecostal ou etc. Além disso, cada igreja possui as suas lutas, então sempre há o que trabalhar, e a perfeição é inexistente deste lado do céu. Outra diferença notável é o grau de companheirismo e amizade entre os pastores não apenas da mesma igreja, mas do presbitério. O nosso café reformado - um encontro semanal - ilustra bem o ponto.

BJC: Como você avalia, então, este primeiro ano como pastor presbiteriano?

Allen: Foi um ótimo ano. Creio que ainda estou me adaptando e aprendendo elementos práticos da estrutura conciliar, mas a experiência como um todo tem sido boa demais. Trabalhar com a pregação expositiva da Palavra é desafiador e enriquecedor; acompanhar os jovens e demonstrar as riquezas do evangelho tem sido muito bom; aconselhar pessoas a partir de uma perspectiva voltada para o coração tem produzido bons frutos; conversar com o conselho - Pbs. Eli, Antenor e Fabiano, meu pastor - o Rev. Ilmar -, e os companheiros de ministério - Rev. Cleomárcio, Rev. Adenauer, Rev. Emílio, Rev. Diogo -, tem sido encorajador; e, finalmente, plantar a igreja no Araçagy tem sido uma experiência inigualável.

BJC: O trabalho de plantação está caminhando bem, então?

Allen: No seu ritmo, sim. Não há pretensões megalomaníacas. Queremos apenas que Deus nos envie as pessoas que Ele tem para nós. E enquanto isso seremos fiéis em ensinar a Escritura. Queremos uma experiência real de comunidade, para que haja beleza em nossa confissão e em nossa vida. Este é um trabalho que leva tempo, e nós não temos pressa. Deus está fazendo acontecer, isso nos basta.

recebido na IPB
BJC: Faltou alguma coisa?

Allen: E isso lá é pergunta que um entrevistador faça?

BJC: Quem faz as perguntas aqui sou eu.

Allen: E/ou eu. Mas, respondendo, sim, faltou. Existe uma dimensão do ministério pastoral que talvez não seja tão mencionada quanto necessário, e eu me refiro ao elemento familiar. Junto com o primeiro ano de IPB, eu experimento o primeiro ano como casado. O que poderia ser um desafio foi, na verdade, fonte de graça e oportunidade de crescimento. Encontrei em minha esposa - Ivonete Porto - grande apoio, compreensão e ajuda nessa caminhada. Creio que é preciso sabedoria neste ponto. Alguns dizem que a vocação é do casal, ao que eu respondo: sim e não. A vocação para o ministério pastoral é do homem, exclusivamente. Mas a esposa está envolvida na situação, de modo que foi vocacionada para ser esposa do pastor, e assim abraçar as circunstâncias que decorrem deste chamado. Na parte que lhe cabe, ela vai muito bem, e isso, mais uma vez, traz gratidão e beleza ao nosso relacionamento e serviço.

BJC: Obrigado pelo bate-papo.

Allen: Eu que agradeço.

Assim terminou a conversa. Não mais ele registrando a hipotética entrevista, mas atuando como narrador e revisor, fechando o texto para logo postá-lo no blog.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Contribuição BJC: Dia da Bíblia - e qual será o dia da leitura? - Por Rodrigo Anselmo da Silva

No menu "contribua" do BJC, há a sugestão de que outras pessoas enviem seus textos, que, após análise, podem ser publicados por aqui. Isso não significa que eu concorde com tudo o que é publicado, mas que há algo importante a ser pensado no texto. Foi assim que o brother Rodrigo Anselmo da Silva me enviou o texto abaixo, refletindo a respeito do dia da Bíblia e seu significado concreto.

Ele é membro da Igreja Batista Plenitude, em São Luís, e deveria criar um blog para compartilhar seus pensamentos! =)

Obrigado, Rodrigo! Eis o texto:

* * * 

DIA DA BÍBLIA – E qual será o dia da leitura?

Por

Rodrigo Anselmo da Silva – Membro da Igreja Batista Plenitude

Hoje, dia 11.12, é de costume no meio evangélico se comemorar o dia da Bíblia. Não vou me deter no fato de que a Palavra de Deus é muito maior do que qualquer data ou até figura cronológica simbólica, de modo que não acho nada demais ter um dia para esta comemoração. Assim como não penso que esta atitude seja relevante a ponto de se criar na cultura atual uma importância para as Escrituras Sagradas, a partir dessa comemoração.

O que sempre me impressionou nesses quase 18 anos de protestante e batista, é o grande apelo e incentivo verdadeiro a leitura, prática e observação ao ensino da Bíblia, e este comentário não é , nem de longe, contrário a esta afirmação. Mas, sinceramente, digo que um dos dias - e sempre pensei nisso - que os crentes mais deixaram de ler individualmente a palavra de Deus, é o domingo. Não nesse domingo, dia 12.11, mas aos domingos, e apresso-me em explicar.

Vamos analisar: quando chegamos na igreja pela manhã, vamos para o culto e depois a EBD, ou se aplica a ordem inversa. De qualquer forma, mesmo sem perceber, já passou o primeiro momento que, de forma geral, nós deveríamos fazer nossa devocional (sim aquela que tentamos realizar diariamente assim que acordamos). O quê? Devocional no domingo? É isso mesmo: você já parou pra pensar que este dia é quase que retirado da lista de vida devocional diária, como se não fizesse parte da semana? Porém, é o primeiro dia da semana! E digo mais: às vezes na liturgia do culto não há um momento para os presentes irmãos abrirem a Bíblia, pois os textos geralmente vêm projetados - via data show ou impressos no boletim. Então vem a pergunta: isso não é retirado da Bíblia? Não é válido? Sim, é, mas veja que o contato propriamente dito com a Escritura já começa, desde cedo, a ser esquecido.

Infelizmente várias vezes a própria pregação - por falta de "tempo num culto muito longo" é pouco preenchida pela leitura da Palavra de Deus. Após o culto matinal, as famílias vão almoçar, por volta das 15h voltam ao lar doce lar e descansam para depois de algumas horas estarem de novo em atuação ministerial e assistindo (ou prestando) culto. E mais uma vez, quase não lemos a Bíblia no domingo a tarde, é incrível. Então restam ainda dois horários, o culto da noite, que geralmente é no sentido de um culto mais evangelístico, dado ao número de visitantes ser geralmente maior do que o matinal, então lê-se uma porção bíblica maior, prega-se o evangelho e - em algumas igrejas - ocorre o momento do apelo....percebeu que em termos de liturgia, o abrir individual da Palavra do Senhor foi mais uma vez esquecido? Nos dias de domingo, é muito pouco usual esta prática. Você já havia refletido nesta questão? E não se trata do domingo em si, como se este fosse amaldiçoado ou coisa parecida, mas é que o foco dos momentos de celebração em comunidade, são rasos no que diz respeito ao ensino e leitura das Escrituras Sagradas, isso na minha visão é um fato e não somente de hoje, não necessariamente pra todas as igrejas e denominações claro, mas é quase unanimidade. Então, depois do culto sempre cai bem uma ida em grupo ao uma boa rede de fast food e ao chegar em casa, você e eu, temos o hábito de ler a Bíblia antes de dormir, depois de tanto cansaço e ativismo diário e semanal? PENSE NISSO!